"Je vous salue, Marie", de Jean-Luc Godard

Vamos imaginar que nos chegasse hoje a notícia de que há uma pequena seita pregando que seu líder nasceu de uma virgem, morreu, ressuscitou e seu corpo realmente não pode ser encontrado. Imaginemos também que ficássemos sabendo disso por acaso, porque a mídia não tem dado a mínima atenção a esse grupo. Iríamos acreditar nessa história?

Parece que quando eventos fantásticos ou miraculosos estão historicamente distantes, eles se tornam mais fáceis de se acreditar. Pensamos que talvez o mundo fosse bem diferente, talvez coisas como uma gravidez sem ato sexual ou a ressurreição dos mortos acontecessem mesmo.

Fui levado a reflexões como essas após assistir ao filme "Je vous salue, Marie", do diretor francês Jean-Luc Godard, em que a história da concepção e do nascimento virginal de Jesus se passam no mundo contemporâneo. O filme sugere uma proposta de uma reflexão sobre uma espiritualidade cristã hoje.

Maria é uma jovem comum, filha de um dono de um posto de gasolina, e José, um jovem taxista com pouca instrução. Depois de dois anos de namoro sem ato sexual, Maria aparece grávida, e José quer saber quem é o pai. Em meio a tudo isso aparece o anjo Gabriel, um homem comum que fuma, anda de táxi e até dá um tapa na cara de José. Um pouco bruto, como todo francês.

Proibido no Brasil na década de 80 por ser considerado ofensivo à fé católica, o filme retrata os dilemas, os fraquejos e as dificuldades de Maria e José como homens comuns, ao mesmo tempo em que conta uma história paralela, de um professor que mantém um caso com uma de suas alunas e que acredita numa teoria de que a vida na Terra foi semeada por extra-terrestres. As duas histórias, sem nenhuma ligação aparente entre si, ilustram a antítese carne e espírito.

O filme traz cenas interessante, como a luta de Maria contra a masturbação e a tentação do jovem casal de resistir à união sexual. Perto do final nasce Jesus, uma criança mimada e que tem um contato "escandalizador" com o corpo de sua mãe numa idade em que já não deveria mais ter essas intimidades. Jesus entra debaixo do vestido da mãe, e fica em pé examinando seu corpo e pedindo explicações do que estava vendo. Ao ver a região pubiana, por exemplo, Maria lhe explica que aquilo é o "ouriço, ou a relva".

José, um pai autoritário mas quase sem respeito para com o filho, é obrigado a se conformar em não ser o verdadeiro pai do menino, que em determinada cena chega a fugir desobedecendo-lhe e dizendo que está indo cuidar das coisas do seu Pai.

Por todo o filme aparecem insistentemente cartões com a mensagem "Naquele tempo", como se a história estivesse acontecendo em um passado distante. Mas a história se passa em nossos dias, sendo talvez esses cartões uma forma com que Godard quis nos mostrar que a história que está sendo contada é atemporal.

É um ótimo filme, profundo, que apesar de mal-compreendido por muitos, coloca importantes questões sobre uma espiritualidade cristã contemporânea. Não uma espiritualidade historicamente distante, ou empoierada em antigos museus e catedrais, mas presente no dia-a-dia dos homens e mulheres comuns. Um escândalo para a igreja.

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  1. Poxa! Este filme parece ser interessante hein?!

    Vou procurar para baixar!

    Abraço!

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  2. É de fato um filme muito interessante. Não sei o que você espera dele, mas previno que não se trata de um entretenimento hollywoodiano.

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  3. Blu-ray à venda em Megacine:
    http://megacine.minestore.com.br/produtos/blu-ray-je-vous-salue-marie-1985

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